O que é que se está a passar? Nada. Vivemos entre dois países opostos. Num, existe uma sociedade dinâmica, em franco progresso, em mudança sempre para melhor em todos os domínios, educativos, laboral, económico, administrativo, tecnológico. No outro, o quotidiano parece cada vez mais duro e insuportável, há insegurança, assaltos, degradação da qualidade de vida, corrupção, ameaças de crise financeira. Criou-se uma clivagem entre os dois, ou há um que é real e o outro imaginário? Colocar assim a questão é construir um quadro artificial relativamente ao nosso «vivido». É certo que vivemos um pouco esquizofrenicamente, mas naquele «nada» que separa os dois mundos algo se passa subterraneamente.
Acontece, antes de mais, que o português voltou à inércia e à passividadeface ás transformações inelutáveis que abalaram a sua existência como destino. A esse estado de espírito acrescentou-se recentemente um processo de interiorização do novo modo de vida a que a modernização o vai condenando. Um grupo social tornou-se emblemático desta conjuntura: o dos professores.
A sua situação não mudou. Justificaria ainda a saída à rua de 100 mil pessoas. Mas, precisamente, uma tal manifestação seria hoje impensável. O Governo e o ME ganharam. Os espíritos estão parcialmente domados. Quebrou-se-lhes a espinha, juntando ao desespero anterior um desespero maior. O ambiente das escolas é agora de ansiedade, com a corrida ao cumprimento das centenas de regulamentações que desabam todos os dias do Ministério para os docentes lerem, interpretarem e aplicarem. Uma burocracia inimaginável, que devora as horas dos professores, em aflição constante para conciliar com uma vida privada cada vez mais residual e mesmo com a preparação das lições, em desnorte com as novas normas (tal professor de filosofia a dar aulas de «babysitting» em cursos profissionalizantes) - tudo isto sob a ameaça da despromoção e do resultado da avaliação que pode terminar no desemprego.
COMO FOI ISTO POSSIVEL? Ccmo foi possível passar da contestação à obediência, da revolta à «servidão voluntaria» como lhe chamava La Boétie? Indiquemos um só mecanismo que o Governo utiliza: a ausência total de resposta a todo o tipo de protesto. Cem mil pessoas na rua? Que se manifestem, têm todo o direito – quanto a nós, continuaremos a enviar-lhe directivas, portarias, regulamentos a cumprir sob pena de… (existe a lei). Ausentando-se da contenda, tornando-se ausente, o poder torna a realidade ausente e pendura o adversário num limbo irreal.
Deixando intactos os meios da contestação mas fazendo desaparecer o seu alvo, desinscreve-os do real. É uma técnica de não-inscrição. Ao separar os meios do alvo, faz-se do protesto uma brincadeira de crianças, uma não–acção, uma acção não performativa. Esta reduz-se a um puro discurso contestário, esvaziado do conteúdo real a que reenviava (é o avesso, no plano da acção, do enunciado performativo de Austin: um acto que é um discurso). Resultado: o professor volta à escola, encontra a mesma realidade, mas sofre um embate muito maior. É essa a força da realidade. É essa a realidade única. E é preciso ser realista. Assim começa a interiorização da obediência (e, um dia, do amor à servidão).
NO PROCESSO de domesticação da sociedade, a teimosia do primeiro-ministro e da sua ministra da Educação representam muito mais do que simples traços psicológicos. São técnicas terríveis de dominação, de castração e de esmagamento, e de fabricação de subjectividades obedientes. Conviria chamar a este mecanismo tão eficaz, «a desactivação da acção». É a não-inscrição elevada ao estatuto sofisticado de uma técnica politica, à maneira de certos processos psicóticos.
José Gil
Acontece, antes de mais, que o português voltou à inércia e à passividadeface ás transformações inelutáveis que abalaram a sua existência como destino. A esse estado de espírito acrescentou-se recentemente um processo de interiorização do novo modo de vida a que a modernização o vai condenando. Um grupo social tornou-se emblemático desta conjuntura: o dos professores.
A sua situação não mudou. Justificaria ainda a saída à rua de 100 mil pessoas. Mas, precisamente, uma tal manifestação seria hoje impensável. O Governo e o ME ganharam. Os espíritos estão parcialmente domados. Quebrou-se-lhes a espinha, juntando ao desespero anterior um desespero maior. O ambiente das escolas é agora de ansiedade, com a corrida ao cumprimento das centenas de regulamentações que desabam todos os dias do Ministério para os docentes lerem, interpretarem e aplicarem. Uma burocracia inimaginável, que devora as horas dos professores, em aflição constante para conciliar com uma vida privada cada vez mais residual e mesmo com a preparação das lições, em desnorte com as novas normas (tal professor de filosofia a dar aulas de «babysitting» em cursos profissionalizantes) - tudo isto sob a ameaça da despromoção e do resultado da avaliação que pode terminar no desemprego.
COMO FOI ISTO POSSIVEL? Ccmo foi possível passar da contestação à obediência, da revolta à «servidão voluntaria» como lhe chamava La Boétie? Indiquemos um só mecanismo que o Governo utiliza: a ausência total de resposta a todo o tipo de protesto. Cem mil pessoas na rua? Que se manifestem, têm todo o direito – quanto a nós, continuaremos a enviar-lhe directivas, portarias, regulamentos a cumprir sob pena de… (existe a lei). Ausentando-se da contenda, tornando-se ausente, o poder torna a realidade ausente e pendura o adversário num limbo irreal.
Deixando intactos os meios da contestação mas fazendo desaparecer o seu alvo, desinscreve-os do real. É uma técnica de não-inscrição. Ao separar os meios do alvo, faz-se do protesto uma brincadeira de crianças, uma não–acção, uma acção não performativa. Esta reduz-se a um puro discurso contestário, esvaziado do conteúdo real a que reenviava (é o avesso, no plano da acção, do enunciado performativo de Austin: um acto que é um discurso). Resultado: o professor volta à escola, encontra a mesma realidade, mas sofre um embate muito maior. É essa a força da realidade. É essa a realidade única. E é preciso ser realista. Assim começa a interiorização da obediência (e, um dia, do amor à servidão).
NO PROCESSO de domesticação da sociedade, a teimosia do primeiro-ministro e da sua ministra da Educação representam muito mais do que simples traços psicológicos. São técnicas terríveis de dominação, de castração e de esmagamento, e de fabricação de subjectividades obedientes. Conviria chamar a este mecanismo tão eficaz, «a desactivação da acção». É a não-inscrição elevada ao estatuto sofisticado de uma técnica politica, à maneira de certos processos psicóticos.
José Gil
Esta conversa toda para dizer mal.
ResponderEliminarNão será necessário um palavreado rebuscado para dizer mal.
Qualquer mudança, mais pequena que seja, causa contestação. Cada um tem o seu quintal, a sua trincheira, os seus bónus, ninguem quer abdicar.
À Tiazoca Magalhães ou a alguêm "perto" dela, devem-lhe ter retirado umas tantas regalias ou algo semelhante, que devem ter vindo a ser pagas em tempo ou em contado, pelos contribuintes.
Então, oportunista, tudo e quem que diz mal do Governo ou dos actuais governantes, são a sua pedra de toque.
Da mesma maneira que não conseguirá com facilidade morder o cotovelo, não dará nenhuma dentada nas gentes que muito tem feito por este país, depois da miséria deixada pelo ex-MRPP Barroso e do playboy Santana Lopes.
Que se catem os maldizentes quea caravana sempre vái andando e daqui para a frente, muito melhor
Eis aqui, no comentário deste anónimo, um excelente exemplo da capacidade intelectual tipo " borderline" de muita gente . São ignorantes , incultos, básicos e pobres de espírito, sendo que só sabem recorrer ao insulto caluniador para se expressarem. E direi mais, acham que todos são como eles, e como tal projectam-se nos insultos que proferem.
ResponderEliminarE são tão incultos que nem sequer vão conseguir perceber o presente comentário.
Pessoal do OL- embora não vos conheça- apeteceu-me dizer-vos isto, tanto mais que o José Gil (que este anónimo desconhece) é um dos maiores pensadores portugueses reconhecido nacional e internacionalmente.
Anunciação, que não tenho o prazer de conhecer;
ResponderEliminarÉ, exactamente, como diz; este 'anónimo' - bastante assíduo - projecta-se nas tentativas de insulto que profere. Sem me conhecer de lado nenhum, - e só porque tenho opinião diferente da dele - vê-se ao espelho e ataca... convenientemente anónimo, claro!
Coitado...!
Só está com o Sousa quem tem tachos a defender porque os socialistas honestos estão de olhos abertos.
ResponderEliminar"Vemos gente bem vestida,
ResponderEliminarno aspecto desassombrada;
são tudo ilusões da vida,
tudo é miséria dourada."
António Aleixo
Este Blog, pelo que posso avaliar, está muito "profissionalizado".
ResponderEliminarQualquer crítica contra é considerada "subversiva".
Será que a quadra de Aleixo, não terá alguma razão de ser ?
Haverá algum motivo especial para que tal possa acontecer?
A quadra do ALEIXO ilustra bem o país do sócrates. As fatiotas Armani e a miséria de larga percentagem do povo.
ResponderEliminarNão estará o anónimo (8 de Outubro de 2008 8:39) a ver o filme ao contrário? Fará parte dos que não concordando com os posts optam pela via do ataque pessoal em detrimento da via da argumentação objectiva?
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