segunda-feira, 6 de agosto de 2007

VIA LONGITUDINAL NORTE - CARNAXIDE

PÚBLICO: Edição Impressa
6 de Agosto de 2007 - 09h36


Câmara de Oeiras viola embargo da CCDR
José António Cerejo



Permitida circulação e retomadas obras em estrada embargada há seis anos. Desvio de ribeira também embargado está a ser concluído. CCDR espera pelo fim das férias para actuar

A Câmara de Oeiras, presidida por Isaltino Morais, está a violar desde há vários meses um embargo decretado em 2001 pela Comissão de Coordenação e Desenvolvimento Regional de Lisboa e Vale do Tejo (CCDR), que a proíbe de retomar as obras da Via Longitudinal Norte (VLN) e do desvio da ribeira do Alto do Barronhos, em Carnaxide.
A chamada de atenção para o facto de o embargo se manter e a advertência de que quaisquer obras no local constituem "manifesta desobediência" foram transmitidas pela CCDR ao presidente da autarquia, em Fevereiro e Abril. Mesmo assim, os trabalhos prosseguem com toda a normalidade e a CCDR não tomou qualquer medida para fazer cumprir as suas determinações. Diz que tratará do assunto "depois do período de férias".
O problema da VLN e do desvio da ribeira do Alto dos Barronhos arrasta-se há seis anos, com processos em tribunal, com o reconhecimento pela CCDR da ilegalidade das intervenções feitas pela autarquia no local e com cerca de 60 famílias a persistir numa prolongada luta contra a actuação camarária, devido às repetidas inundações que atingem as caves dos seus prédios desde que as obras foram iniciadas, no tempo de Isaltino Morais.
Em meados de 2005, com Teresa Zambujo na presidência, a autarquia acabou por reconhecer expressamente a razão dos moradores, comprometendo-se a suspender as obras então em curso à revelia do embargo da CCDR e a deslocar a ribeira, bem como a VLN, para longe dos prédios. Graças a esse entendimento, os moradores autorizaram a câmara a utilizar parcialmente o troço da via já feito, por um período de quatro meses, para que fosse possível construir um viaduto sobre a auto-estrada do Estoril. A utilização da via, porém, ficaria reservada "exclusivamente" para o acesso à obra do viaduto e às empresas instaladas na zona, conforme consta de um compromisso então subscrito por Teresa Zambujo em Junho de 2005. Perante este acordo, a CCDR autorizou a utilização "a título meramente precário de metade da plataforma" do troço embargado, na condição de aí não serem realizadas quaisquer obras até à solução do litígio.
Os problemas voltaram depois das eleições de Outubro de 2005, altura em que Isaltino Morais regressou à presidência da câmara: os compromissos de Teresa Zambujo foram postos de lado e foi permitida a circulação na VLN a todo o género de viaturas, apesar de o viaduto estar concluído há muito.
Mais do que isso, a câmara recomeçou há vários meses as obras de regularização da ribeira e retomou a construção da VLN em direcção a Carnaxide.
Posta ao corrente da situação, a CCDR pediu explicações à câmara por duas vezes, sublinhando que "quaisquer actos praticados em inobservância" do embargo de 2001 "ocorreram e ocorrem em manifesta desobediência ao mesmo, com as implicações que daí advirão". No último ofício sobre o assunto, datado de Abril, uma das suas vice-presidentes fixou mesmo um prazo de 15 dias para que a autarquia se pronunciasse.
Daí até agora nada aconteceu, a utilização da via prossegue sem qualquer restrição e as obras continuam em ritmo acelerado. De acordo com uma resposta escrita da presidência da CCDR ao PÚBLICO, o presidente da câmara ainda não deu satisfação aos seus pedidos e solicitou a marcação de uma reunião.
A comissão acrescenta que só tomará qualquer medida depois de uma reunião que "está a agendar" com todas as partes e que "se deverá realizar depois do período de férias".
A câmara, por seu lado, não forneceu qualquer explicação. A agência de comunicação que para ela trabalha informa que Isaltino Morais está de férias. Os moradores não entendem a inacção da CCDR face à actuação da Câmara de Oeiras e dirigiram na semana passada uma carta ao secretário de Estado do Ordenamento do Território em que acusam a entidade fiscalizadora de "cumplicidade" com o arrastar da situação. No documento, as administrações dos condomínios dos cinco prédios afectados pedem uma audiência urgente, "dado a postura da CCDR", e dizem que este organismo "limita-se a confirmar que mantém a obra embargada". Também na semana passada, os moradores apresentaram uma "denúncia criminal" à Porcuradoria-Geral da República contra Isaltino Morais e os directores municipais com responsabilidade no caso.
O conflito entre a Câmara de Oeiras e os moradores da Rua Amândio César, na Outurela, tem a sua génese nas sucessivas deslocações ilegais do leito da ribeira do Alto dos Barronhos, um afluente da ribeira da Outurela, feitas nos últimos dez anos pela Câmara de Oeiras.
As obras em causa foram sempre efectuadas sem o competente licenciamento das autoridades que tutelam o domínio hídrico e permitiram que os lucros da urbanização dos terrenos envolventes fossem maximizados. Em consequência dessas intervenções, porém, os moradores têm sofrido graves danos, que se traduzem na sistemática inundação das garagens dos seus prédios sempre que chove um pouco mais e em sucessivas avarias dos elevadores.
A última das mexidas na linha de água consistiu no seu desvio, em 2001, para uma vala aberta e revestida de pedra armada junto às traseiras dos prédios acabados de construir na Rua Amândio César. O objectivo foi o de permitir que a Via Longitudinal Norte (VLN) fosse feita numa faixa para onde a ribeira tinha sido encaminhada anos antes (para viabilizar a construção dos prédios daquela rua), sem afectar a propriedade vizinha, que a empresa Ferreira & Magalhães pretende ainda urbanizar.
As consequências desta operação, que deixou alguns dos prédios a apenas seis metros da ribeira e com as suas caves frequentemente inundadas, foram de imediato agravadas por um enorme aterro, paralelo e contíguo à nova linha de água, sobre o qual começou a ser construída a VLN.
A nova estrada, que tem características de via rápida e atravessará os concelhos de Oeiras e Cascais, nasceu, por isso, muitos metros acima da ribeira e das caves dos prédios. De acordo com os moradores, a VLN constituiu-se como uma verdadeira barragem que contribui para as inundações e para o aumento da circulação de águas subterrâneas. J.A.C.

Fim
© Copyright PÚBLICO Comunicação Social SA

1 comentário:

E disse...

Porque será que isso não me surpreende?