Silvia de Oliveira - Jornal I
Para mal do primeiro-ministro, esperemos que não do país, muita coisa mudou nestas eleições, da esquerda à direita.
Depois de duas semanas de uma campanha eleitoral capaz de fazer corar Cavaco, Sócrates e Manuela Ferreira Leite, pelo menos, e de uma noite eleitoral onde a maior emoção foi saber quem seria a terceiro maior partido no Parlamento, se o Bloco, se o CDS-PP, nada como uma série de números gelados para nos devolver à realidade. O reporte enviado ontem pelo INE a Bruxelas, não poderia ter saído num momento mais apropriado. No day after, segundo as contas do instituto nacional de estatítica, o défice orçamental deverá duplicar este ano, de 2,7% para 5,9% do PIB - um valor que coincide com a previsão oficial do Governo -, e a dívida pública degradar-se-á de 66,3% do PIB, em 2008, para 74,5%, no final deste ano. É que é esta a dura realidade, a de um país em crise apertado pela sua dívida - se se contabilizassem os encargos com as parcerias público-privadas e a dívida das empresas públicas, o peso da dívida pública no PIB não seria de 74,5%, mas antes acima dos 100%. Quanto ao défice orçamental, o inevitável.
Já dentro de dois meses, é esperada a primeira reprimenda da Comissão Europeia, através de um novo procedimento por défice excessivo. Ou seja, a exigência de um rumo para endireitar a prazo as contas públicas. E, mais uma vez, de nenhum consolo serve ao país que metade dos Vinte e Sete tenha o mesmo problema.
Não somos a Alemanha, aliás, a economia portuguesa só recuperará se antes a alemã sair desta crise.
Perante este cenário, a primeira pergunta para este governo é simples: como irá Sócrates, depois de uma vitória tudo menos "estrondosa", tudo menos "extraordinária", conseguir cumprir o seu programa eleitoral? Terá dinheiro para executar as medidas de apoio às empresas e às famílias, ao mesmo tempo que controla a vontade de desapertar o sufocante colete da disciplina orçamental? Terá determinação para avançar com as reformas e ainda a inteligência emocional necessária para envolver a Oposição numa governação de alto risco? No seu discurso de vitória, José Sócrates disse que esperaria agora pela indigitação presidencial do primeiro-ministro para iniciar as consultas com todos os partidos com assento parlamentar, numa "atitude de diálogo democrático". Muito bem.
Resta saber qual é o conceito de Sócrates para diálogo. As suas credenciais nesta área não são as melhores e também não são poucas as dúvidas sobre quão apurado será o sentido de responsabilidade dos seus vários interlocutores no Parlamento, de Paulo Portas ao futuro líder do PSD.
Para mal de Sócrates, esperemos que não do país, muita coisa mudou e ainda vai mudar, da esquerda à direita. Não se sabe, sequer, quem sucederá a Manuela Ferreira Leite no principal partido da Oposição. Ironicamente, o Presidente da República foi ate hoje, o melhor aliado do primeiro-ministro. Refém de uma história que não pode, não sabe ou não quer contar, Cavaco Silva sabe que assim, sem explicações plausíveis sobre o caso das escutas a Belém, terá de pensar duas vezes antes de incomodar o Governo.
1 comentário:
É sabido que o Sr Presidente da República se esqueceu de muita coisa... e que com a sacrossanta mania de querer estar "de bem com Deus e com o Diabo" fala quando não deve e cala-se quando seria imperioso que falasse.
Que neste mandato tudo tem feito para ser reeleito também é sabido. E que o PS não poderia aspirar a ter um melhor inquilino em Belém, iden iden.
Aguardo com curiosidade as declarações que esta noite fará ao país.
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