sábado, 24 de março de 2012

Tristes ironias

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Tristes ironias

 

 

O ponto final na aventura do TGV não surpreende, pois só irresponsáveis de pai e mãe podem sustentar que um País pobre e endividado até à medula ainda se endivide mais para satisfazer megalomanias e eleitoralismos. Se tivesse havido bom senso, nem Durão Barroso teria dado o pontapé de saída no projecto, nem Sócrates o teria elevado ao cubo, com a aceitação tácita do então ministro das Finanças, Teixeira dos Santos, conhecedor profundo do descalabro das contas públicas nacionais.

Por: José Eduardo Moniz


A ironia das coisas é que esse mesmo membro do antigo Governo socialista, apesar da lástima em que deixou o País, poderá, segundo consta, ser proposto pela Caixa Geral de Depósitos para administrador não executivo da PT. A acontecer, a sua nomeação apenas vai acentuar nos cidadãos a noção de que, na política portuguesa, há um bloco que protege os que o integram, independentemente da cor partidária que traz agarrada. Mais: fortalecerá a convicção de que há uma rede de interesses na esfera do Estado que subsiste e que, apesar da diminuição da presença pública em grandes empresas, elas ainda continuam a ser instrumentos activos nos jogos de Poder, expondo-se a situações, no mínimo, discutíveis.


Não sou dos que põem em causa a honestidade de propósitos de Passos Coelho, mas a verdade é que do seu Executivo se esperaria actuação mais clara em várias frentes e mais determinada no esforço de transformação do País. A energia que coloca na adopção de medidas de austeridade deveria ser a mesma, por exemplo, a aplicar na mudança da organização administrativa nacional. Portugal tem municípios em excesso, mas, em vez de se avançar para supressões e fusões, cede-se aos interesses instalados nas câmaras (que criaram um "insignificante" buraco de 12 mil milhões), atacando-se apenas os elos mais fracos, ou seja, as juntas de freguesia, por sinal, as entidades que mais próximas dos cidadãos se encontram. Os barões regionais e locais que infestam os partidos adquiriram um peso incomensurável e teceram uma poderosa rede de influências que manieta qualquer intenção reformadora e verga quem manda.


É pena que se vá perigosamente acentuando nos cidadãos a ideia de que as diferenças partidárias se resumem a formas distintas de fazer a gestão das carências gerais, apenas com nuances no rigor a empregar, mas sempre à custa dos direitos, regalias e dinheiro das populações. A expectativa de que à mudança de Poder não corresponda só uma simples dança de cadeiras esfuma-se progressivamente. Não é saudável para a democracia (que, com todos os defeitos que porventura incorpore, é o melhor sistema que se pode ter), mas, acima de tudo, não é bom para os partidos, que são os seus principais intérpretes.


O PSD dispõe agora, no seu congresso, de uma oportunidade para arrepiar caminho. É uma questão de vontade e de coragem.

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