Violência. Polícias atribuem responsabilidade a quem deu ordem de actuar
“As imagens são muito fortes para que a PSP não faça nada”, reconheceu o porta-voz. A condenação foi unânime
(foto Hugo Correia/Reuters)
“Quando dão a ordem para avançar, é quase impossível travar-nos, já não  ouvimos ninguém, deixa de haver uma linha de pensamento, e a questão de  serem fotojornalistas ou cidadãos nem se nos coloca naquele momento: a  nossa função é limpar o local”, confessou ao i um agente do Corpo de Intervenção (CI) que pediu o anonimato.
Depois da escalada de violência entre PSP e manifestantes na greve  geral de quinta-feira, com uma detenção e três feridos (dois deles  fotojornalistas), ontem foi a vez da escalada mediática das  consequências. E a condenação pública foi unânime (ver caixa).
Mesmo a PSP, através do seu porta-voz, Paulo Flor, reconheceu aos  jornalistas que “as imagens são muito fortes para que a PSP não faça  nada”, referindo-se às fotografias e vídeos que ontem circularam mundo  fora, via redes sociais e a imprensa. Emblemática passou a ser a  fotografia da Reuters em que um agente espanca uma fotojornalista da  AFP, Patrícia de Melo Moreira, também colaboradora do i. Paulo  Flor revelou ainda que a PSP “já está a recolher todas as imagens e  notícias para analisar o sucedido”, pois “quer perceber o que se  passou”.
Patrícia de Melo Moreira foi agredida por agentes da Equipa de  Intervenção Rápida da PSP, mas já o fotojornalista da Lusa, José Sena  Goulão, que recebeu assistência hospitalar, foi agredido por três  elementos do CI, que actuou depois de perdido o controlo. “E bateram  para magoar”, garantiu Sena Goulão.
Segundo Ricardo Noronha, uma testemunha ouvida pelo i, “tanto o  polícia agressor como a fotojornalista agredida já nos acompanhavam  desde a praça do Saldanha, era impossível o agente não saber quem ela  era quando a agrediu no Chiado”. Segundo Noronha, os incidentes surgiram  “quando a PSP tentou deter um dos manifestantes”. Os restantes  “tentaram pacificamente impedir e foi aí que a PSP começou à bastonada”.  A resposta “foi o arremesso de garrafas de água e cerveja”, seguindo-se  “a entrada da polícia de choque, que até senhoras de idade agrediu”.
Não só a PSP vai averiguar internamente as decisões que levaram a esta  violência. Também a Inspecção-Geral da Administração Interna o vai  fazer. Estes inquéritos juntam-se aos de 24 de Novembro de 2011, data da  última greve geral, em que também se registaram agressões policiais,  uma delas também a um colaborador do i, o fotojornalista Eduardo  Martins. Segundo fonte policial, “um inquérito deste género demora no  mínimo seis meses, mas pode ir até ano e meio, pois ouvem-se todos os  envolvidos, polícias e queixosos”.
Os processos de averiguação “são prejudiciais para os agentes, a  suspeita de irregularidades afecta a carreira, o que até trava os  agentes mais impulsivos”, revelou o mesmo agente do Corpo de  Intervenção. “Tenho a certeza de que, 20 minutos depois da bastonada à  jornalista, o agente arrependeu-se e muito, pois a cara dele está nos  jornais”, acrescentou.
Este polícia de choque lembrou que “na greve de 24 de Novembro  detivemos um homem que estava a dar pontapés nas grades frente à  Assembleia da República, mas quando já estava algemado disse que  pertencia às brigadas de investigação criminal da PSP”. Recordou o  episódio a rir para lembrar que “às vezes basta um polícia para lançar a  confusão, basta uma acção individual precipitada para tudo descambar,  pois estamos ali muitas horas, sem saber se vamos entrar em acção, é  stressante”. Este agente não tem dúvidas de “que a violência das  manifestações vai aumentar a partir daqui”. Ainda assim, garantiu que  “as chefias recomendam- -nos sempre calma, pois não querem raspanetes do  director nacional [da PSP], que por sua vez não quer raspanetes do  ministro [da Administração Interna]”.
Repúdio   Ontem foi dia  de “repúdio”. Cerca de 80 jornalistas, muitos deles da Agência Lusa,  cuja direcção de informação apresentou queixa pela agressão a Goulão,  estiveram frente à Direcção Nacional da PSP em protesto. Entregaram uma  carta a repudiar a acção policial e exigiram desculpas formais.
Também o Sindicato de Jornalistas (SJ) pediu um inquérito “rigoroso” e  “condenou a acção policial”. Quanto à sugestão feita pela comissária  Carla Duarte, da PSP, para que os jornalistas passem a usar coletes, o  SJ diz que o uso de coletes não pode tornar-se lei, pois “os jornalistas  passam a ser um alvo a abater”.
Já o ministro da Administração Interna, Miguel Macedo, quer uma reunião  com o SJ e com os directores de informação para definir as regras que  identifiquem os jornalistas.

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