quinta-feira, 11 de dezembro de 2008

TRICAS


Paula Teixeira da Cruz, Advogada

Da Vida Real

Tricas

Com os Estados Unidos da América em recessão, foi de pronto anunciado um megaplano de investimentos em infra-estruturas, o maior dos últimos cinquenta anos naquele país. A situação impõe responsabilidade a democratas e a republicanos. Vai-se ao essencial sem tricas nem desculpas. Obama sem medo de sombras.

Nós vamos a caminho da terceira recessão em oito anos e continua a não haver plano algum. Finalmente Vítor Constâncio, governador do Banco de Portugal, certificou a dita recessão. Custou mas foi, como se a dita não se sentisse neste Inverno de desconforto, vento e frio.

Ironicamente, quando se celebram os sessenta anos da Declaração Universal dos Direitos do Homem, o Mundo está mais longe dela do que esteve após as guerras do século passado. A Declaração era suposto ser um ponto de partida para uma espécie de ‘harmonia universal’. Hélas, cavaram-se os fossos culturais e só o ‘comércio’, na pior acepção e com as piores consequências, parece ‘juntar’ os povos para desgraça de todos. Dos Direitos propriamente ditos fez-se o caminho da restrição em nome de um securitarismo inconsequente e perverso.

Até mesmo o projecto europeu está hoje tão longe do espírito dos founding fathers quanto um asceta de um novo-rico.

E uma paralisia desculpante tolhe a iniciativa e a capacidade de cada um de nós.

Se temos modelos a reinventar vamos lá a isso e quanto mais depressa melhor: dos políticos aos económicos, não esquecendo os cívicos e a responsabilidade que cada um de nós também tem nisto tudo. E responsabilize-se. Cultive-se a responsabilidade que é coisa que anda ausente. Ninguém se sente responsável. São sempre os outros. Mentalidades.

Pois neste pano de fundo esperar-se-ia exemplo de responsabilidade dos principais agentes políticos e da sociedade em geral. E menos tricas. E menos ausências.

Mas é precisamente neste contexto que a inflexibilidade do Governo para com o Presidente é particularmente desastrada e pouco inteligente. É a última altura a escolher para provocar fissuras em nome de pequenas tácticas que, sobretudo em momentos difíceis, não compensam e se pagam caro. E pior ainda se for em nome de geometrias eleitorais. Como é a pior altura para o Parlamento se desrespeitar a si próprio.

Se a sociedade portuguesa quiser continuar a ter o direito ao disparate, terá o retorno.

Tal como em Lisboa, continuaremos atulhados em lixo.


Correio da Manhã - 11 Dezembro 2008

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