É mau de mais para ser verdade
Francisco José Viegas, Escritor
Acho que está a fazer-se uma grande tempestade num copo de água a propósito do Estatuto do Aluno e da subsequente trapalhada que foi a votação do diploma no Parlamento. Na verdade, já estava previsto que tudo isto acontecesse. Os ministros da Educação, depois de resolverem os assuntos prementes da matéria administrativa da sua casa, raramente conseguem alterar o essencial; e o essencial é a qualidade do ensino; e combater pela qualidade do ensino é lutar pela elevação do grau de exigência e de rigor em todos os graus de frequência escolar. Os professores e os sindicatos estão fora dos corredores da 5 de Outubro, e acaba por ser fácil penalizar e humilhar professores. Já os pedagogos, os ideólogos do edifício escolar e os teóricos que se têm encarregado de embrulhar o sistema de ensino, esses, estão instalados no ministério.
Todos os conhecemos. Têm, antes de mais, um discurso muito próprio, cheio de metáforas e de ditirambos que nunca se referem a coisas práticas, que dificilmente estão relacionados com a escola e as suas dificuldades em existir e que, no fundo, vivem de experiências pedagógicas e vagamente científicas.
Maria de Lurdes Rodrigues encontrou o caminho facilitado; tratou de introduzir alguma racionalidade na administração escolar e na vida dos sindicatos, na "operacionalidade" e no mapa escolar. Mas, quando se esperava que essa coragem fosse transposta para a área fundamental, que é o ensino propriamente dito, entrámos no mundo do puro delírio.
Com as críticas ao processo de avaliação de professores a avolumar-se, aconteceu a polémica da TLEBS, terminologia linguística para o Básico e o Secundário. Depois de demonstrados os erros científicos metodológicos de grande parte da sua formulação, o ministério dividiu-se; um secretário de Estado prometeu (e comprometeu-se) suspender a TLEBS; um director-geral reconheceu erros mas defendeu que o ministério devia continuar a dá-los e a ampliá-los. Vendo bem como as coisas estão, verifica-se que continua tudo igual e que a política do ministério continua a aprofundar o ruinoso caminho aberto pelos delírios ideológicos que transformaram o ensino do Português numa banalidade e que vandalizaram o ensino da Matemática.
Geralmente, o ministério acha que está munido de excelentes ideias. Um grupo cada vez mais numeroso (porque se acumulam as suas assinaturas ao longo dos anos) de técnicos e burocratas dessa ideologia passa incólume no meio da asneira. Eles acham que estão munidos de excelentes ideias. Mas, mesmo depois de se ter provado que essas ideias dão péssimos resultados, aqui ou no estrangeiro, mesmo depois de terem recebido críticas demolidoras, tudo continua na mesma, ou pior.
O ensino - nomeadamente a ideologia que está por detrás de todas as decisões do ministério em matéria pedagógica e científica - está entregue a esse monstro corporativo que supõe ter toda a verdade do seu lado. O estatuto do aluno e o seu regime de faltas é apenas mais um episódio lamentável a acrescentar a tantos outros. É, geralmente, gente que não conhece a escola real, que não tem contacto com o dia-a-dia das escolas, que imagina os professores como meros instrumentos ao seu dispor para as experiências mais descabidas. As vítimas dessas experiências descabidas são os nossos filhos - e é o seu futuro. Por isso, o sinal dado pelo Ministério é definitivamente mau e constitui um erro grave, desculpabilizando os alunos faltosos, penalizando os alunos cumpridores e sobrecarregando os professores e as escolas com outra categoria de "desprotegidos" os que, deliberadamente, faltam às aulas. Tudo para adulterar e manipular as estatísticas, o que é grave demais.
Francisco José Viegas escreve no JN, semanalmente, às segundas-feiras
2 comentários:
Este país está «mau de mais para ser verdade».
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país... PAÍS ?!
LUGAR MAL FREQUENTADO como bem disse o O'Neill...
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