sexta-feira, 22 de fevereiro de 2008

Limonadas com açucar


Já que a Primavera anda por aí, e porque na semana passada falei de laranjas, nesta viro-me para os limões. Não, não vou abrir nenhuma quinta biológica, tudo se passa no reino das metáforas, o meu território preferido quando escrevo sobre sexo e amor.Aprendi há muitos anos com uma amiga mais velha que sempre que a vida nos dá limões, devemos fazer limonadas. Mais cedo ou mais tarde todos apanhamos amargos de boca e, perante tal contingência, há quem engula em seco, quem gorgoleje, quem cuspa no prato em que comeu, quem parta a casa toda e quem se ria de si próprio.

Cada um faz limonadas como pode e sabe; as mulheres relatam ao mundo o seu desgosto sob a forma de emails, telefonemas para as cinco melhores amigas, desabafos com todas as colegas de secção, com a massagista e com o rapaz da TV Cabo que foi lá a casa arranjar a internet. Os homens recolhem à caverna, lambem as feridas em silêncio e saem para a caça quando se sentem com mais força. Os que acreditam que ferida de cão só se cura com pêlo de outro cão abrem as hostilidades. Os que precisam de luto e de sossego ficam quietos a marinar a tristeza até conseguirem esquecer o caso. Homens e mulheres reagem de forma quase oposta a um desgosto de amor. Eles guardam o melhor do que viveram e olham para trás sem mágoa, elas, pelo contrário, tendem a fazer deles uns monstros e não descansam enquanto não elaboram uma lista exaustiva de razões e motivos de tudo o que correu mal.

É verdade que muitas vezes eles são mais frios, mais pragmáticos. Têm pena, mas sabem encolher os ombros e não olhar para trás. Ainda que fiquem a remoer, possuem uma capacidade inata para transformar um sentimento em pensamento. As mulheres tendem a ficar presas no limbo do passado, afogando o presente em recordações, o que as faz perder muito tempo.

Uma das formas mais eficazes para combater a nostalgia do passado é pôr açúcar na limonada; descobrir o que nos dá prazer, aprender a rir das figuras ridículas que às vezes fazemos e deixar correr a vida de uma forma optimista e sem medo, à espera do melhor sem esperar nada. E porque uma grande paixão pode provocar uma grande adição, é bom aprender, tal como um ex-alcoólico, a viver um dia de cada vez.

Ir ao cinema, rever velhos amigos de sempre, voltar ao local de férias da adolescência, experimentar novos tipos de cozinha, redecorar a sala, visitar exposições, passear junto ao rio ou em jardins públicos, descobrir novos géneros de música, fazer desporto, saborear o sol e aprender a respirar devagar e a dormir melhor parecem sugestões de psicólogo de vão de escada, mas o que é facto é que funcionam. Quando não existe ninguém com tempo e amor para se dedicar a nós, temos sempre o nosso próprio amor, o amor-próprio. E esse não é nenhuma metáfora nem figura de estilo; cultiva-se como uma árvore que quando cresce nos dá sombra e abrigo. Um limoeiro, por exemplo.

2 comentários:

Rui Freitas disse...

Simplesmente correcto, belo e verdadeiro. Cada qual "entenderá" como quiser...

Isabel Magalhães disse...

'Cada um faz limonadas como pode e sabe;'

Tal e qual!