Com os agradecimentos a: http://alfarrabio.di.uminho.pt/vercial/index.html
« Um povo imbecilizado e resignado, humilde e macambúzio, fatalista e sonâmbulo, burro de carga, besta de nora, aguentando pauladas, sacos de vergonhas, feixes de misérias, sem uma rebelião, um mostrar de dentes, a energia dum coice, pois que nem já com as orelhas é capaz de sacudir as moscas; um povo em catalepsia ambulante, não se lembrando nem donde vem, nem onde está, nem para onde vai; um povo, enfim, que eu adoro, porque sofre e é bom, e guarda ainda na noite da sua inconsciência como que um lampejo misterioso da alma nacional, - reflexo de astro em silêncio escuro de lagoa morta
(...)
Uma burguesia, cívica e politicamente corrupta ate à medula, não descriminando já o bem do mal, sem palavras, sem vergonha, sem carácter, havendo homens que, honrados (?) na vida íntima, descambam na vida pública em pantomineiros e sevandijas, capazes de toda a veniaga e toda a infâmia, da mentira à falsificação, da violência ao roubo, donde provém que na política portuguesa sucedam, entre a indiferença geral, escândalos monstruosos, absolutamente inverosímeis no Limoeiro (...)
Um poder legislativo, esfregão de cozinha do executivo; este criado de quarto do moderador; e este, finalmente, tornado absoluto pela abdicação unânime do pais, e exercido ao acaso da herança, pelo primeiro que sai dum ventre, - como da roda duma lotaria.
A justiça ao arbítrio da Política, torcendo-lhe a vara ao ponto de fazer dela saca-rolhas;
Dois partidos (...), sem ideias, sem planos, sem convicções, incapazes (...) vivendo ambos do mesmo utilitarismo céptico e pervertido, análogos nas palavras, idênticos nos actos, iguais um ao outro como duas metades do mesmo zero, e não se amalgando e fundindo, apesar disso, pela razão que alguém deu no parlamento, - de não caberem todos duma vez na mesma sala de jantar (...)»
(...)
Uma burguesia, cívica e politicamente corrupta ate à medula, não descriminando já o bem do mal, sem palavras, sem vergonha, sem carácter, havendo homens que, honrados (?) na vida íntima, descambam na vida pública em pantomineiros e sevandijas, capazes de toda a veniaga e toda a infâmia, da mentira à falsificação, da violência ao roubo, donde provém que na política portuguesa sucedam, entre a indiferença geral, escândalos monstruosos, absolutamente inverosímeis no Limoeiro (...)
Um poder legislativo, esfregão de cozinha do executivo; este criado de quarto do moderador; e este, finalmente, tornado absoluto pela abdicação unânime do pais, e exercido ao acaso da herança, pelo primeiro que sai dum ventre, - como da roda duma lotaria.
A justiça ao arbítrio da Política, torcendo-lhe a vara ao ponto de fazer dela saca-rolhas;
Dois partidos (...), sem ideias, sem planos, sem convicções, incapazes (...) vivendo ambos do mesmo utilitarismo céptico e pervertido, análogos nas palavras, idênticos nos actos, iguais um ao outro como duas metades do mesmo zero, e não se amalgando e fundindo, apesar disso, pela razão que alguém deu no parlamento, - de não caberem todos duma vez na mesma sala de jantar (...)»
In:http://veritas.blogs.sapo.pt/ , da Obra de Guerra Junqueiro “Pátria” (1896)
Sobre o Poeta e a sua Obra:
11 comentários:
Transmissão de pensamento?
Por causa desta 'nossa' estranha forma de ser ando há dias a pensar, precisamente, em Guerra Junqueiro...
(Pessoalmente não me identifico muito com o retrato certamente por via da minha 'costelinha' celta. :)))
??
Olá Isabel
Mas o retrato é do Guerra Junqueiro. É ele que fotografa a sociedade portuguesa e nos transmite a sua decepção de "Vencido da Vida". Agora, somos livres de pensar ou não como ele ao reflectirmos sobre a sociedade presente. Mas que parece haver algo atávico... lá isso. Enfim
Fernando;
Eu sei que o 'retrato' é do Guerra Junqueiro'...
Tem dúvida? Até lhe disse que andei a pensar nele (precisamente porque conhecia o texto e se aplica 'ainda' à nossa actual capacidade de 'alombar'...) :)
[]
I.
Não sei se me expliquei bem...
a citada 'transmissão de pensamento' era minha e sua. O Fernando achou pertinente publicar o texto e eu, pelo mesmo motivo, andava há dias a pensar nele. :)
.
Ontem como hoje...
E, é o mais certo, como amanhã...
Abraços
.
Tão distante e ao mesmo tempo tão actual... :)
Olá Isabel
Tem razão, a minha linguagem às vezes parece cifrada. Referia-me ao retrato da sociedade feito por Guerra Junqueiro.
Comos diz estrellinha parece que a história se repete.
A alternância na política pode ser virtude. Porém com o tempo surgem hábitos velhos, criam-se clientelas e aparecem acordos de cavalheiros, etc. , etc,....
Fernando;
Acho que há 'troca de linhas' ou então estou mais 'loura' do que é hábito! :)))
Queria eu dizer que não me identifico com o 'retrato' que ele traça do nosso povo, talvez devido à minha herança de uma outra costela.
'resignado, humilde e macambúzio, fatalista e sonâmbulo, burro de carga, besta de nora, aguentando pauladas, sacos de vergonhas, feixes de misérias, sem uma rebelião, um mostrar de dentes, a energia dum coice,'
Eu 'sou rebelde, mostro os dentes e dou coices', - se preciso for - e refilo, e não me calo porque não sou resignada, jamais fatalista e nunca macambúzia.
Quanto ao resto 'Tudo como dantes no Quartel de Abrantes'! :))
:))
[]
I.
É inquestionável que a História se repete, mas não será que ela sempre foi assim, com alguns [poucos] pequenos interregnos?
Hoje, o Poeta certamente diria “ ex-Ditosa Pátria minha amada…”
Um destino traçado em 1143, desde a batalha de S. Mamede…Ah D. Teresa…D. Teresa, quanta falta de coragem e força tiveste, Senhora!...
Em tempos disse: Se a Constituição permitisse ou obrigasse a que fossem tornados públicos os dizeres apostos nos boletins de voto, por tal razão tornados “nulos”, certamente que hoje não teríamos abstenções de 40/50/60%, porque se estava a dar voz a um Povo e, dessa forma, talvez que hoje tivéssemos outra categoria de Políticos e pudéssemos estar a contradizer G. Junqueiro
E, depois disto, chamem-me o que quiserem e entenderem.
FR
A fr
Em bom rigor a História nunca se repete. É como a água que nunca passa dua vezes debaixo da mesma ponte. Os tempo são outros e os homens também. Porém,a nossa percepção é essa, pricipalmente quando as estruturas, os condicionalismos permanecem. A meu ver esse é que é o problema.
D. Teresa, o filho que bateu na mãe. Não é preciso ir tão longe. Depois disso, depois de 1415 (Ceuta) habituámos a complementar a nossa economia medieval com o suplemento do "ultramar": ouro, escravos, pimenta, acúcar, ouro outra vez, remessas de emigrantes (Brasil séc XIX), remessas de emigrantes (Europa séc XX)e depois Fundos Europeus. Que virá a seguir.
Este poderá ser um dos problemas estruturais. Concerteza que há outros. O esbanjamento,a especulação (imobiliária, bolsista, etc.) a corrupção, a falta de participação cívica (ou ausência de incentivo) e, como diz, o voto de 4 em 4 anos.
Mas há esperança...que nunca morre, é certo porque..." um povo, enfim, que eu adoro, porque sofre e é bom" (Guerra Junqueiro)já se "alevantou" algumas vezes.
Porque não outra vez!
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