Li num jornal que a senhora ministra da Educação está contente. E, quando os nossos governantes estão contentes, é como se um sol raiasse nas nossas vidas.
E está contente porque, segundo afirmou, a violência nas escolas portuguesas, afinal, não existe.
Ao que parece, andamos todos numa de paz e amor, lá fora é que as coisas tomam proporções assustadoras, os nossos brandos costumes continuam a vingar nos corredores de todas as EB, 2/3, ou como é que as escolas se chamam agora. Tenho muita pena de que os nossos governantes só entrem nas escolas quando previamente se fazem anunciar, com todas as televisões atrás, para que o momento fique na História. É claro que, assim, obrigada, também eu, anda ali tudo alinhado que dá gosto ver, porque o respeitinho pelo Poder é coisa que cai sempre bem no coração de quem nos governa, e que as pessoas gostam de ver em qualquer telejornal.
Mas bastaria a senhora ministra entrar incógnita em qualquer escola deste país para ver como a realidade é bem diferente daquela que lhe pintaram ou que os estudos (adorava saber como se fazem alguns dos estudos com que diariamente se enchem as páginas dos jornais) proclamam. É claro que não falo daquela violência bruta e directa, estilo filme americano, com tiros, naifadas e o mais que houver.
Falo de uma violência muito mais perigosa porque mais subtil, mais pela calada, mais insidiosa.
Uma violência mais "normal"
E não há nada pior do que a normalização, do que a banalização da violência.
Violência é não saberem viver em comunidade, é o safanão, o pontapé e a bofetada como resposta habitual, o palavrão (dos pesados…) como linguagem única, a ameaça constante, o nenhum interesse pelo que se passa dentro da sala, a provocação gratuita ("bata-me, vá lá, não me diga que não é capaz de me bater? Ai que medinho que eu tenho de si…", isto ouvi eu de um aluno quando a pobre da professora apenas lhe perguntou por que tinha chegado tarde…)
Violência é a demissão dos pais do seu papel de educadores - e depois queixam-se nas reuniões de que "os professores não ensinam nada".
Porque, evidentemente, a culpa de tudo é sempre dos professores - que não ensinam, que não trabalham, que não sabem nada, que fazem greves, qualquer dia - querem lá ver? - até fumam…
Os seus filhos são todos uns anjos de asas brancas e uns génios incompreendidos.
Cada vez os pais têm menos tempo para os filhos e, por isso, cada vez mais os filhos são educados pelos colegas e pela televisão (pelos jogos, pelos filmes, etc.). Não têm regras, não conhecem limites, simples palavras como "obrigada", "desculpe", "se faz favor" são-lhes mais estranhas do que um discurso em Chinês - e há quem chame a isto liberdade.
Mas a isto chama-se violência. Aquela que não conta para os estudos "científicos", mas aquela da qual um dia, de repente, rompe a violência a sério.
E então em estilo filme americano.
Com tiros, naifadas e o mais que houver.
Alice Vieira, Escritora
Alice Vieira escreve no JN, quinzenalmente, aos domingos
5 comentários:
A senhora 'menistra' vive noutro planeta.
.
E [a 'menistra'] devia ter estado no lugar duma minha irmã, quando um dia destes, há pouco tempo, foi à básica onde tem o filho de ca. 11 anos a estudar, buscá-lo.
Ao entrar na escola, por volta das 18h30, reparou que um rapaz calmeirão de cerca de 16 anos estava a insultar e a dar murros no peito de outro mais pequenito.
Naturalmente admoestou-o.
O 'calmeirão', que se deve achar um grande 'homem', agarrou a minha irmã pelo braço, tentou agredi-la, o que ela conseguiu impedir, e insultou-a de P U para cima...
O caso seguiu com uma queixa na Polícia Segura.
Mas enfim, a 'vaca' é que sabe...
.
Ai o 'calmeirão' agrediu a tua irmã física e verbalmente? Já estou a ver o 'filme' todo, a 'culpa' é dos professores! De quem mais?!
Como diz a Alice Vieira, a senhora ministra deveria ir de surpresa a algumas escolas, - de zonas reconhecidamente ditas perigosas - para poder avaliar 'ao vivo e a cores' e não fazer como um conhecido ex-Presidente da República que foi à Cova da Moura acompanhado de comitiva e escolta e disse, às TVs, que o local era seguro.
.
I.,
"... de zonas reconhecidamente ditas perigosas..."
Intencionalmente não referi qual a escola, mas garanto que esse não é o caso (a zona), agora quanto à 'frequência', tem muitos 'calmeirões' dos 'tais' bairros que nós sabemos...
O problema é haver descontinuidade na progressão lectiva, o que faz com que haja muitos miúdos de 15 e 16 anos ainda no 6º ou 7º Ano e coisas assim. A Básica vai até ao 9º.
Isto mistura idades muito díspares, com resultados negativos.
Os 'maiores' aproveitam-se dos mais pequenos, em todos os sentidos.
Com 16 anos o normal seria estarem já na Secundária a frequentar para aí o 10º.
Qual é a solução ?
Segundo este governo e esta 'menistra' é passá-los 'à força'...
Até ao 12º 'persupuesto'. E depois temos uma cambada de jovens que têm o Certificado mas completamente ignorantes, a quem os 'estudos' não servem para nada.
Para mim a solução era: Queres estudar, estudas. Não queres, vais trabalhar para as obras!
Quem não quisesse estudar, não estudava (é um direito) e o estado, as autarquias, arranjava-lhes trabalho, p.ex., nos jardins, na limpeza das vias, no saneamento, etc., remunerado, é claro.
.
Enviar um comentário